domingo, 24 de novembro de 2013

Felizes sem filhos (parte II)

Não quer filhos? Como assim?

Em uma sociedade em que o normal aceitável ainda é casar e ter filhos, não desejá-los pode trazer alguns incômodos. Muitas vezes, mais difícil do que tomar a decisão é explicar para a família e os amigos que, sim, é possível ser feliz sem a maternidade. As mulheres ouvidas para esta reportagem e todas as outras com quem se conversou sobre o assunto são unânimes em afirmar que já foram questionadas, pressionadas e até mesmo constrangidas com perguntas e afirmações do tipo:

- Você diz isso agora porque não tem filhos. Quando tiver, vai pensar diferente.
- Que horror, não diz isso!
- Se teu marido não tiver filho contigo, vai ter com outra.
- Não vais saber o que é o amor até seres mãe.
- Isso é egoísmo da tua parte.
- Que vida triste tu vais ter!
- Só serás mulher de verdade quando tiveres um filho.

Diante da patrulha, muitas mulheres desenvolvem mecanismos para driblar as situações desconfortáveis. A psicóloga Fabiane Machado, por exemplo, responde que é estéril aos que a interpelam com insistência. Ocorre que ela nunca sequer tentou engravidar. Explicar sempre a mesma coisa, no entanto, já não é mais tolerável. Então, simplesmente inventa uma história mais constrangedora que a pergunta. E assim se livra dos inconvenientes interrogatórios sobre sua intimidade.

A necessidade de uma explicação para não desejar a maternidade tem raízes culturais. Um estudo coordenado pela socióloga britânica Katherine Hakim chamado Childless in Europe revela que, antes do aparecimento dos anticoncepcionais e da revolução sexual dos anos 1960, as mulheres não tinham filhos por causa da pobreza ou das guerras. Não tê-los era sinônimo de desgraça, miséria ou algum tipo de castigo divino que as fez inférteis. Hoje, ao contrário, cerca de 20% das européias não são mães - e somente 2% ou 3% delas não o são por infertilidade.

O mito da mãe que padece no paraíso e a aura de sublimação em torno da maternidade também ajudam a explicar o estranhamento que a decisão de não procriar ainda provoca. Mas até isso está em transformação. Parir e criar filhos já não é sinônimo de indiscutível felicidade graças a relatos de pais e mães dispostos a desvelar as faces nada divertidas de se ter filhos, sem idealização, sem romantismos. Uma das primeiras a tirar o véu que encobre os problemas da maternidade foi a bibliotecária americana Selena Giampa, que criou o blog Because Motherhood Sucks (Por que a maternidade enche o saco, em livre tradução). Ela afirma que adora ser mãe e que tem momentos de intensa felicidade. O problema é que, entre um desses momentos e outro, tudo que ocorre é desgastante e chato. Relatos como o dela abrem caminho para que outros pais e mães sintam-se menos culpados ao admitir que a função não é só alegria e que requer, sim, altas doses de paciência, renúncia e esforço. E que está permitido recusar-se a enfrentar tamanho desafio.

Algumas celebridades, que já manifestaram publicamente a decisão de não ter filhos, também ajudam as mulheres comuns sem instinto materno a sentirem-se menos extraterrestres. As atrizes Cameron Diaz, Helen Mirren, Oprah Winfrey, Renee Zellweger e a brasileira Totia Meirelles são algumas das que já declararam que fihos não têm espaço em suas vidas. E que são bem felizes desse jeito.

Fonte: Jornal Zero Hora
Foto: Carlos Macedo / Agencia RBS
Reportagem: Patricia Lima
Fotos: Adriana Franciosi

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